Por que os pratos de restaurantes chiques estão cada vez menores?

Gente, é batata: toda vez que posto no Insta a foto de um prato desses de ‘restaurante chique’, meus amigos de infância logo comentam: ‘só isso?’.

Fui dar uma olhada no histórico de mensagens do meu Instagram e reli algumas reações: ‘depois disso, um hambúrguer’, disse um amigo.

‘Uma enrolada no garfo e acabou, SOS’, escreveu outro sobre uma pequena porção de linguini com manteiga e levedura desidratada. Até minha mãe reclamou do tamanho de um prato que postei há algumas semanas.

Os pratos estão, sim, ficando menores — até mesmo nos restaurantes mais casuais, onde ‘a sugestão da casa são 4 a 5 por pessoa’, como sugere o garçom em tom blasé.

Onde foi parar aquele caprichado prato de espaguete à bolonhesa das cantinas italianas que mal nos permitia ver quem estava à nossa frente? O que aconteceu com os pratos de pedreiro antes tão comuns?

Depois dos alimentos industriais terem perdido peso nas embalagens (sem que o preço tenha diminuído, claro), agora parece que vivemos uma era de ‘Ozempiczação’ das porções nos restaurantes. Tudo mais magrinho que o de costume.

Há motivo

Mas há uma razão para isso, defendem-se os chefs: comer menos para comer mais — e, muitas vezes, melhor. Pode parecer contraditório, mas há uma explicação.

Em uma era em que se come fora mais para ter uma ‘experiência’ do que sair satisfeito, faz sentido que restaurantes queiram mostrar mais do que são capazes de fazer.

O cliente vai e, em vez de comer um prato só, pode provar quatro coisas diferentes, expandir sua refeição a novos sabores, estender a visita por novos caminhos, desbravar combinações que não conhecia — e que não pediria se tivesse apenas uma oportunidade. À mesa, geralmente optamos pelo seguro.

É o que acontece nos restaurantes de alta gastronomia, onde ao invés de uma entrada, um prato e uma sobremesa, o chef propõe menus-degustação, em que pode contar sobre a cozinha que faz em muitos pequenos pratinhos.

E quando eu digo muitos, não é força de expressão: em alguns jantares, já cheguei a provar mais de 40 ‘momentos’, em refeições que levaram algumas boas horas para terminar.

Degustar em alta

A ideia dos menus assim ganhou força na França da década de 1970, quando cozinheiros do país criaram um movimento culinário chamado de Nouvelle Cuisine (nova cozinha) defendendo pratos mais leves e delicados, com ênfase na apresentação.

Foi a partir dessa ideia que se tornou popular chamar esses pratos menores de ‘pratos franceses’, ou de ‘restaurante francês’. Anos depois, foi o catalão Ferran Adrià que decidiu levar as degustações a números ainda mais elevados em seu icônico restaurante El Bulli.

‘Todos nós fazíamos menus de degustação de 10, 12 pratos, e ele de repente começou a fazer 20, 20 e poucos’, diz o chef Juan Mari Arzak no documentário Las Huellas de elBulli.

Adrià mostrou que snacks e pratos muito conceituais também tinham um lugar em restaurantes, e podiam ser incluídos na experiência que os clientes pudessem ter no restaurante. Muitos deles se tratavam apenas de uma colherada literalmente, ou um bocado de uma dentada só — que se tornaram mais comuns hoje.

Mas o que parece pouco nem sempre é. Porque a comida é, sobretudo, proporção.

Nos pratos da alta gastronomia, essa regra se aplica ainda mais — até porque muitos dos ingredientes têm sabores muito potentes, e comê-los em grandes quantidades não seria prazeroso para nosso paladar.

Fartura não é tudo

Outra questão é a possibilidade que os chefs têm de trabalhar com ingredientes de maior qualidade, ou até mesmo difíceis de conseguir.

Ao reduzir a quantidade que serve de um delicado ouriço do mar em um prato, por exemplo, um cozinheiro pode dividi-lo em um maior número de clientes, permitindo mais pessoas provarem um pouco do que seja da iguaria.

Isso não significa que se coma menos, entretanto. Em uma refeição substanciosa, a média consumida por um homem adulto é de 500g por refeição — para a mulher a quantidade é de cerca de 400g. Isso é muita comida, claro.

No Brasil, estivemos sempre acostumados com a fartura à mesa, onde comida só é comida se houver porções generosas de tudo, principalmente bem acompanhados de muito arroz, muito feijão, etc.

Esse sempre foi o padrão da classe média, antes de aprofundarmos a ideia de comer fora. Aos poucos, aprendemos que pão, entrada, prato principal e sobremesa nem sempre precisa ser a única forma de comer.

Num país em que nos restaurantes mais populares paga-se e come-se quanto quiser por quilo e rodízios de todos os tipos, fomos acostumados com a quantidade em detrimento da qualidade. E fartura não é tudo na hora de comer.

Nestes novos restaurantes de pequenos pratos, os 20-e-tantos momentos podem significar muito mais comida que um prato feito daqueles de restaurante tradicional, ainda que a percepção, pela quantidade ser servida em pequenas porções e por mais tempo, é que não se comeu tanto.

Mas são raras as vezes que saio de um restaurante com o desejo de parar na hamburgueria mais próxima. Na maioria das vezes, vou embora com dificuldade de manter a barriga restrita à circunferência da calça e pedindo por um antiácido.

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