Forest City: O Sonho Futurista que Virou Pesadelo

De longe, Forest City parece um empreendimento imobiliário de sucesso, com torres de luxo à beira-mar. Anunciada há uma década como uma cidade futurista e sustentável, com um investimento de US$ 100 bilhões, a ideia era lançar 700 mil imóveis em quatro ilhas artificiais no Sudeste Asiático. Mas, ao se aproximar, fica claro que o projeto, vendido como um paraíso luxuoso para a classe média chinesa, é um fiasco até agora.

Forest City deveria ser uma joia da economia chinesa na costa malaia. Mas as crises se acumularam, e hoje ela se junta a outros fracassos imobiliários que queriam ganhar fama internacional, mas só chamam atenção pelo vazio existencial de concreto e ideias erradas que representam.

Que lugar é esse?

A Country Garden, uma das maiores incorporadoras do mercado chinês no início da década passada, anunciou Forest City como um de seus projetos mais ousados. A empresa cresceu com um modelo de construir rápido e vender rápido, aproveitando uma economia aquecida. Anúncios de Forest City foram espalhados nas maiores cidades da China, prometendo ilhas tropicais acessíveis e modernas. Quem demonstrasse interesse podia voar até lá para ver com os próprios olhos, a convite da Country Garden. Corretores imobiliários destacavam que fechar negócio era um bom caminho para ganhar vistos especiais e cidadania malaia.

A estratégia funcionava na China, onde investir em imóveis é comum. Mais de 80% das famílias vivem em casa própria, e mais de 20% dos moradores de áreas urbanas têm mais de um imóvel. A Country Garden decidiu levar o modelo para fora do país, mas as coisas começaram a dar errado. Em 2014, logo no início das obras, elas foram suspensas por alguns meses devido a dúvidas do governo de Singapura sobre a segurança ambiental do projeto.

A situação foi aparentemente resolvida, e em 2016 o próprio primeiro-ministro da Malásia, Najib Razak, participou da inauguração de Forest City. A construtora anunciou 20 mil novos imóveis e um campo de golfe para aquele ano. Mas a China minou o empreendimento ao proibir seus cidadãos de comprarem propriedades no exterior para proteger sua moeda. Como Forest City foi projetada para o público chinês, o golpe foi duríssimo.

No início desta década, a pandemia e a grave crise política na Malásia foram novos baques. Uma empresa estatal malaia, que detém 40% do investimento, vem tentando reviver Forest City, que virou uma zona financeira especial e, em 2024, deixou de cobrar taxas de escritórios de investidores super-ricos.

Não parece ter dado certo. Forest City, hoje, parece um exemplo de megalomania frustrada. Um youtuber de Singapura visitou a cidade e entrou nos apartamentos. O jornal “The New York Times” também foi conferir e descreveu a torre de escritórios no coração do complexo como trancada com correntes e vigiada por guardas. À noite, o prédio mal era visível, exceto por uma placa de LED verde quebrada, piscando ocasionalmente. Nos blocos de apartamentos próximos, andares inteiros estavam escuros. As lojas do shopping, antes destinadas ao varejo de luxo e compras duty-free, estavam acorrentadas.

Pouca gente mora de fato lá. Aqueles que compraram apartamentos continuam morando na China e alugam a propriedade na Malásia. A Country Garden diz que vendeu 80% dos apartamentos a investidores de 20 países, mas não informa quantas pessoas vivem em Forest City. A maioria das pessoas que circulam pelas ruas são trabalhadores como jardineiros, coletores de lixo, faxineiros, seguranças ou funcionários de lojas, vindos de países como Indonésia, Bangladesh, Paquistão e Nepal. Os chineses, que supostamente viriam para morar, são turistas.

Das quatro ilhas prometidas pela Country Garden, só uma saiu do papel. Dos 700 mil imóveis, só 26 mil apartamentos viraram realidade. Dos 700 mil moradores projetados, só 9 mil são habitantes de fato. São 31 quilômetros quadrados de frustração imobiliária. Ainda assim, a empresa insiste no plano e declarou que o projeto não sofrerá alterações e seguirá construindo de acordo com a demanda.

Fiasco sustentável

Eficiência energética, baixa poluição e “sensibilidade sustentável” foram alguns dos termos usados no marketing de Forest City. Mas é complicado transformar isso em realidade quando se constrói uma cidade do zero em um local que afeta duas áreas de grande importância ecológica. As obras atingiram o maior prado de ervas marinhas da Malásia e um manguezal importante para a proteção da costa de 38 vilas no estado de Johor. Na própria Forest City, os danos ficaram visíveis logo no início: rachaduras começaram a aparecer em alguns prédios e ruas, porque a construção foi tão rápida que não deu tempo suficiente para o mangue se estabilizar. Forest City estaria até afundando.

O fracasso também apareceu em aspectos éticos e econômicos. Denúncias de corrupção salpicaram o projeto, que em nenhum momento pareceu estender a mão à população local. Não só os preços dos imóveis eram impeditivos para o mercado malaio, como até a sinalização das ruas, muitas vezes, está escrita apenas em chinês.

Forest City fica no sul de Johor, a ponta sul da Península Malaia que, no passado, foi um sultanato. No século 19, quando se tornou um protetorado britânico, o governo local decidiu construir uma nova capital. A cidade, Johor Bahru, hoje uma das maiores cidades da Malásia, foi erguida em uma área pantanosa. Para preparar o terreno e desenvolver a economia, o sultanato estimulou a imigração de trabalhadores javaneses e chineses. O povo que veio a trabalho para erguer uma metrópole agora não quer voltar para morar numa cidade fictícia, porque viu que é uma roubada.

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