Apagão em Portugal: Uma Reflexão Sobre Nossa Dependência da Tecnologia

Estava na minha segunda caneca de café do dia quando a internet caiu. Decidi fazer uma pausa para ir ao banheiro e percebi que a luz não acendia. Sem eletricidade! 😱

Apagão Nacional

Em poucos minutos, recebi mensagens de amigos dizendo que também estavam sem energia. Uma amiga de Lisboa estava na mesma situação. Era um apagão em Portugal, todo o país desconectado.

Logo, as mesmas notícias chegaram da Espanha e de outras partes: não se sabia se era um ataque cibernético, uma falha completa dos sistemas ou apenas uma queda repentina.

Hora do Almoço

Chegou a hora do almoço e não havia como cozinhar. Em Portugal, a maioria das casas tem placas de indução, que precisam de eletricidade. A saída foi fazer uma salada: folhas verdes, tomatinhos, salmão defumado e torrada por cima. 🍅🥗

Mais difícil foi ficar sem café: sem poder ferver água, nem usar a máquina de cápsulas. Para a dor de cabeça da abstinência de cafeína, uma dipirona.

Desconectado

No meio da tarde, a internet do celular também caiu. Sem contato com o mundo externo, decidi sair de casa, ver as ruas e comprar pão, caso a energia demorasse a voltar.

Primeiro supermercado fechado, segundo também. Nas mercearias dos bairros, os imigrantes permaneciam abertos: indianos, chineses, paquistaneses — um bom dia para lucrar.

Havia filas e filas de pessoas diante do incerto, sem saber quanto tempo aquilo ia durar; quanto de comida precisávamos.

Kit de Emergência

Há um mês, a Comissão Europeia sugeriu que todos os cidadãos europeus mantivessem em casa um kit de emergência com recursos suficientes para 72 horas. Será que foi um aviso? Uma premonição?

Vida nas Praças

Nas praças, alguns pareciam alheios à possível gravidade da situação. Os bares abertos estavam lotados — o calor de 28 graus em plena primavera ajudava no clima de feriado nacional.

Funcionários dispensados das empresas mais cedo, ainda com os crachás, faziam uma espécie de happy hour às 15h30. A cerveja saía gelada das torneiras mantidas com serpentinas.

Para comer? “Só está dando para frituras”, dizia a senhora, colocando risoles e chamuças oleosas numa travessa de alumínio. Comprei duas por garantia e ainda peguei uma Coca-Cola para manter a cafeína no organismo.

Piquenique

No jardim em frente à Biblioteca Municipal, grupos sentados na grama faziam piquenique com o que trouxeram de casa, enquanto crianças corriam atrás das pombas, como se fosse um domingo de verão.

No bar especializado em sanduíches de pernil assado, os funcionários brasileiros montaram uma operação na mesa da rua: sanduíches em embalagens de isopor, prontos para levar. Pagamento só em dinheiro, já que os terminais estavam fora do ar.

Voltando para Casa

De volta a casa, comi os iogurtes que estavam na geladeira para não estragarem. No jantar, fiz o mesmo com os queijos e ainda abri uma lata de patê de cavala apimentada e um espumante que estava ali há algumas semanas esperando uma ocasião especial. Um pouco de borbulhas para dissimular, sempre funciona.

Reflexão

É desconcertante pensar em como não estamos prontos para falhas de serviços. Se faltar água totalmente, quantas garrafas você teria na despensa até começar a morrer de sede? E enlatados? E outros alimentos que não demandam fogo, água, cozimento?

Eu tinha pouco. As pessoas, aparentemente, também. O que explica o clima de apocalipse nos supermercados abertos, com prateleiras esvaziadas e carrinhos cheios como se fossem compras de três meses. Uma lembrança da pandemia que entalou na garganta.

Abri a geladeira de novo e peguei uma gelatina: na primeira colherada, aquilo era 100% líquido. Voltei para tentar avaliar a situação do resto: um corte de Angus, um pouco de verduras, muitas embalagens de iogurte.

Por mais algumas horas nessa situação, a saída para eles seria o lixo. A imprensa, que nunca deixou de informar aqueles que tinham internet para acompanhar, já trazia reportagens sobre quais alimentos descartar ou manter.

Retorno da Energia

Em pouco mais de uma hora (ou 10 horas no total!), a luz regressou — para logo em seguida voltar a cair. Foi um suspiro de ilusão, que se transformou em alívio meia hora depois, quando já à noite as ruas voltaram a se acender, os semáforos a piscar e as pessoas a sorrir.

Ainda deu tempo de ir à geladeira pegar a latinha de cerveja; mas ao invés de comemoração, a consciência lembrou que no dia seguinte a rotina estaria restabelecida — era preciso acordar cedo e trabalhar.

E talvez fazer uma nova lista de compras. Uma que não dependa tanto da energia elétrica, do conforto do cotidiano ou da ideia de que o amanhã será sempre igual ao hoje. Porque a gente nunca sabe quando o mundo vai, literalmente, se desligar.

Fonte: https://www.uol.com.br/nossa/colunas/rafael-tonon/2025/05/01/durante-o-apagao-em-portugal-a-dieta-do-caos-foi-da-salada-ao-espumante.htm

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