Mukti Bhawan: O Hotel da Morte em Varanasi

Em tempos de pandemia, vimos imagens chocantes de corpos abandonados nas ruas e valas coletivas. Mas na Índia, a cremação dos corpos não causou tanto impacto, já que é um rito importante no hinduísmo. O que chocou foi a quantidade de cadáveres.

Varanasi: A Cidade Sagrada

Em Varanasi, a cidade mais sagrada do hinduísmo, a cremação é parte do cotidiano. Ser cremado e ter as cinzas jogadas no Rio Ganges pode ajudar a romper o ciclo de reencarnações e atingir o moksha, a libertação. Por isso, as piras crematórias são comuns na paisagem.

Mukti Bhawan: O Hotel da Morte

Para facilitar esse processo, surgiram lugares como o Mukti Bhawan, onde pessoas se hospedam para passar seus últimos dias. Não é um residencial para idosos, mas um tipo de hotel da morte. A hospedagem dura em média duas semanas.

O Mukti Bhawan é um prédio simples, de dois andares, construído no início do século 20. Os quartos têm cama, uma pequena janela e uma cadeira. Sem televisão, frigobar ou serviço de quarto. A decoração se limita a imagens de divindades e escrituras hindus.

Alguns hóspedes são pacientes terminais. Outros apenas sentem que sua hora chegou. Turistas não são aceitos.

Refeições e Meditação

Durante a hospedagem, o local oferece refeições simples e vegetarianas. A pessoa pode mergulhar na atmosfera meditativa do local e se preparar para deixar este mundo. As famílias muitas vezes acompanham o processo.

Christopher Justice, especialista em envelhecimento, documentou nos anos 1970 alguns estabelecimentos dedicados à boa morte, algo tão importante quanto a boa vida.

O Rei da Cremação

Na cidade da morte sagrada, existe alguém com um cargo único, o “rei da cremação”. Om Chaudhary, 20 anos, ocupa o cargo desde a morte do pai. Ele e sua família fazem parte da comunidade doma, subgrupo da casta dalit, a dos intocáveis.

Chaudhary é responsável por manter a principal pira acesa, o tempo todo, todos os dias do ano, no Manikarnika Ghat, o maior centro de cremação de Varanasi.

Existem mais de 80 ghats na cidade. São escadarias que levam até a margem do Ganges e servem para banhos e cerimônias ritualísticas. Alguns, como Manikarnika, são usados apenas para cremação.

Manikarnika tem capacidade para receber até 150 cadáveres por dia. O custo começa em 3 mil rúpias (cerca de R$ 190), mas pode ser mais de dez vezes mais caro, dependendo da qualidade da madeira usada.

Nas procissões, famílias enlutadas entoam orações fúnebres enquanto carregam o corpo do ente querido em macas de bambu envoltas em tecidos laranjas, vermelhos ou de outras cores vibrantes.

A discriminação histórica sofrida pelos doma fez com que muitas pessoas evitassem estar no mesmo ambiente que eles. A família de Chaudhary já passou fome no passado.

Isso não impediu que seu pai fosse reconhecido pelos serviços prestados à sociedade, recebendo uma das mais altas comendas destinadas a um civil.

Na função desde os 15 anos, Chaudhary deve ter um longo mandato como rei da cremação. Na capital sagrada da morte, a vida parece ter um novo significado.

Fonte: https://www.uol.com.br/nossa/colunas/terra-a-vista/2025/08/11/tem-check-in-mas-nao-tem-check-out-os-hoteis-da-morte-na-india.htm

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