Restaurantes Fechando: O Impacto da Crise e as Novas Oportunidades

Gente, quem acompanha o mundo da gastronomia já deve ter percebido: todo dia surge uma notícia de restaurante fechando, seja nas páginas dos jornais ou nos posts das redes sociais. É um verdadeiro terremoto no setor!

Estamos falando de restaurantes estrelados em Berlim, casas de comida tradicional no Centro de Lisboa, aquele boteco clássico na esquina do Rio de Janeiro. Nova York, Auckland, Bangkok, São Paulo… ninguém está imune.

É um abalo global que está derrubando alguns projetos, enquanto outros comemoram mesas lotadas e reservas com meses de antecedência.

A situação está tensa para os empreendimentos gastronômicos. Primeiro, porque os preços dos alimentos subiram, assim como as contas de água, luz e gás. Repassar esses custos para os clientes pode ser um tiro no pé.

Claro que a inflação está destruindo os restaurantes. Pesquisas apontam que os custos aumentaram quase 25% nas contas mensais. Ingredientes básicos estão com preços nas alturas.

Mas quando o preço dos pratos dobra ou triplica, ou quando as porções diminuem, fica difícil não ver um certo oportunismo.

Mesmo com menos gente indo aos restaurantes — só em setembro, o volume de vendas do setor de bares e restaurantes brasileiros caiu 4%, segundo o Índice Abrasel Stone —, a percepção é que estamos gastando mais ao jantar fora, o que tem feito muita gente reduzir os pedidos.

Ou escolher mais entre um restaurante e outro, o que significa que alguns estão sofrendo com a falta de clientes em dias que deveriam estar lotados.

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Os dois lados do balcão

Os restaurantes estão vivendo tempos de oscilações, e nossas contas inflacionadas (tanto na geladeira quanto no final do jantar) nos empurraram para direções bem divergentes.

Em meio às reclamações sobre o custo de comer fora, surgiu uma reavaliação pessoal do que queremos de uma visita a um restaurante — o que ganhamos com a experiência e quanto isso realmente vale. Em tempos de apertar os cintos, tudo o que não é necessário passa a ser questionado.

Nós, clientes, ficamos mais seletivos, pensamos melhor onde investir nosso dinheiro limitado e queremos que uma saída valha mais como ‘um programa’ do que apenas uma refeição. Jantamos fora menos do que costumávamos — e provavelmente menos do que gostaríamos.

Do outro lado do balcão, a situação cria uma pressão e um descontentamento enorme por parte dos donos de restaurantes e chefs que, principalmente depois da pandemia, passaram a questionar o modelo de seus negócios.

Ou até se querem, de fato, se dedicar a eles da mesma maneira: trabalhar muito e incansavelmente, passar horas de pé e longe de suas famílias, ganhar menos do que a rotina e o esforço deveriam.

Sucesso para quem?

Em um artigo publicado na semana passada no The New York Times, o escritor e ex-crítico gastronômico Frank Bruni relata um fenômeno recente entre chefs e cozinheiros.

Muitos encontraram caminhos alternativos em busca de reconhecimento e sucesso profissional. ‘Nos últimos anos, eles [os chefs] viram os restaurantes se tornarem mais difíceis e caros de operar, enquanto o mundo da comida se diversificou e apresentou novas rotas a serem exploradas’, escreveu.

Para Bruni, ‘há muitas saídas criativas, empregos lucrativos e oportunidades de se conectar com entusiastas da comida muito além dos restaurantes’. Muitos dos chefs relatam, claro, qualidade de vida e cuidados com saúde mental como fatores decisivos.

Foi uma notícia bombástica no setor de restauração espanhola quando o chef Dani García anunciou o fechamento de seu restaurante homônimo em 2019, justamente depois de alcançar a terceira estrela Michelin — o Olimpo da gastronomia onde quase todos os chefs sonham em chegar um dia e que pouquíssimos ascendem.

Na época, em uma entrevista que fiz com ele, ele se dizia ‘cansado do mundo da alta cozinha’, que exige uma pressão enorme por excelência, trabalhos inesgotáveis e uma expectativa ‘quase inalcançável’. Muitos seguiram o mesmo caminho no decorrer dos anos.

Com a ressaca da pandemia, depois de terem redescoberto o prazer de estarem em casa mais tranquilos com suas famílias, os chefs (como antes os garçons e profissionais da sala) passaram a questionar se fazia sentido voltar para as suas rotinas de trabalho exaustivas.

Somaram-se a isso, claro, fatores econômicos, especialmente no atual mercado em que o dinheiro e o esforço necessários para fazer um restaurante decolar e mantê-lo no azul desencorajam muitos cozinheiros de sequer tentar.

A matemática sempre pesou contra os restaurantes. Dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), apontam que 8 em cada dez restaurantes no Brasil fecham nos dois primeiros anos.

Passar dos 5 anos, ainda mais, é um objetivo alcançável para poucos — o que explica o fato de poucos restaurantes ficarem antigos.

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Preço das estrelas

Um estudo recente publicado no Strategic Management Journal, Déa conta que os restaurantes que recebem estrelas do guia Michelin — o mais cobiçado da gastronomia — têm ainda mais probabilidade de fechar.

Pesquisadores da Escola de Administração da University College London (UCL) rastrearam restaurantes de Nova York muito bem avaliados que abriram entre 2000 e 2014.

Eles descobriram que aqueles que ganharam uma estrela Michelin tinham mais chances de fechar do que aqueles que não ganharam — mesmo considerando a localização, o preço e o tipo de culinária.

No final de 2019, 40% dos restaurantes premiados com estrelas Michelin de 2005 a 2014 haviam fechado. A fama, ao que parece, é mesmo efêmera.

Novos rumos

É sobre isso que pensam os chefs e empresários hoje: vale mais um reconhecimento imediato e passageiro, ou investir em uma carreira mais longeva e bem-sucedida, ainda que longe das cozinhas profissionais.

Os caminhos são muitos e mais diversos hoje do que passar horas e dias a preparar os mesmos pratos de novo e de novo.

Entre projetos pop-up e escrever livros, apresentar programas e criar canais no YouTube, os chefs buscam novas alternativas — amparados pelas redes sociais ou guiados por seus objetivos pessoais.

Querem provar, afinal, que há vida além dos restaurantes. O fechamento de muitos deles pode representar algumas histórias que terminam, nem sempre com final feliz.

Mas ao mesmo tempo indicam novos rumos e possibilidades para muitos profissionais do setor que sabem que suas vidas não precisam se resumir às paredes cobertas de azulejo de uma cozinha com investimentos milionários.

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